sexta-feira, 28 de setembro de 2012

“LUTA PELA TERRA NÃO DEVE TER LIMITES”, DEFENDE SÁNCHEZ GORDILLO




Nome mais conhecido entre partidários da reforma agrária na Espanha, Juan Manuel Sánchez Gordillo liderou marcha de trabalhadores em agosto e chamou a atenção ao tomar alimentos de um supermercado e distribuir a famílias pobres. Chamado de “Robin Hood espanhol” por publicações como o Financial Times, ele justifica a necessidade de ações de desobediência civil em entrevista exclusiva a Carta Maior.
Guilherme Kolling e Naira Hofmeister, de Marinaleda, Espanha

Marinaleda - Juan Manuel Sánchez Gordillo é um nome conhecido na Espanha desde o início dos anos 1980, quando liderou trabalhadores do pequeno município de Marinaleda na ocupação de um latifúndio improdutivo. Prefeito da localidade e deputado na Andaluzia, ele ainda é um ativista importante da reforma agrária.
Voltou ao noticiário em agosto, ao liderar uma marcha do Sindicato Andaluz de Trabalhadores (SAT) pela distribuição de terras públicas a pequenos produtores, contra cortes nos gastos sociais e por punição dos banqueiros responsáveis pela crise. O grupo ocupou agências bancárias, palácios e supermercados de multinacionais, de onde levou alimentos sem pagar para distribuir a famílias necessitadas.
Esgotado ao final da caminhada de um mês pelo sul da Espanha, Gordillo recebeu a reportagem da Carta Maior em sua casa no dia 9 de setembro. Nesta entrevista, ele defende as ações de desobediência civil e argumenta que a forma de luta pela terra não deve ter limites. 
Ainda avalia que a reforma agrária hoje na Espanha é mais necessária do que no século XIX, sustenta que a fixação do jovem no campo passa por receber as mesmas oportunidades que teria na cidade, e elogia o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) do Brasil, para ele o mais importante movimento de massas do mundo na atualidade. 
Também demonstra esperança nos Indignados, fala sobre o Fórum Social Mundial e comenta o sistema de participação popular no município que comanda há três décadas. “A democracia direta é um veículo imprescindível para uma nova esquerda e um novo mundo”.

Carta Maior - A ocupação de latifúndios improdutivos é uma estratégia utilizada há décadas no Brasil para lutar pela reforma agrária. Esse tipo de ação ainda é válido ou há outras formas melhores de reivindicar a distribuição de terras?
Sanchez Gordillo - Penso que a terra, como o ar e a água, forma parte da natureza e, portanto, não deve servir para o enriquecimento privado, mas sim para a comunidade que habita uma determinada área. A terra, a água, as sementes devem formar parte dessa comunidade basicamente para a produção de alimentos, como direito, não como negócio. É o que eu chamaria de soberania alimentar.
A forma ideal de reivindicar que a terra esteja a serviço da comunidade é fazendo marchas, protestos ou tomando supermercados como vocês fizeram recentemente?
Creio que a forma de luta não deve ter limites. E há que se ter imaginação para abrir novos métodos de luta que o sistema custe a superar. Porque o clássico movimento de luta, de alguma maneira, o sistema teve a capacidade de absorvê-lo e convertê-lo em algo que não inquieta ao seus interesses. Portanto, é imprescindível ter muita imaginação no método de luta, claridade nos objetivos e constância na peleia.

Qual é a importância da reforma agrária hoje na Espanha?
Na Andaluzia (comunidade que reúne as províncias do sul do país), 2% dos proprietários detém 50% das terras cultiváveis. É uma estrutura quase feudal, que não é própria dos nossos dias. Diria que a reforma agrária no século XXI é mais necessária do que no século XIX, porque o alimento deve cumprir um papel estratégico. No futuro, quem controlar os alimentos vai controlar o planeta. Da mesma forma que há guerra pelo petróleo, acredito que haverá por água potável e alimentos. Toda a pessoa tem que comer, então, não é razoável um sistema em que três quartas partes da humanidade passe fome e se joguem alimentos fora no mar. 
É necessária essa reforma que ponha os recursos básicos da natureza a serviço do ser humano. O velho sistema de agricultura capitalista fracassou: aumentou a fome no mundo, vieram os transgênicos, apareceram monopólios financeiros que controlam todo o comércio mundial. Portanto, a reforma agrária é imprescindível, é uma luta em que estamos há muito tempo porque acreditamos que o futuro de uma Andaluzia livre e soberana dificilmente será feito sem uma reforma agrária, com todas as suas consequências.

E há uma janela na legislação espanhola que permita fazer essa reforma agrária?
Não. Teve na Segunda República uma lei de reforma agrária e (o ex-ditador Francisco) Franco a liquidou. Depois, em 1984, houve uma tentativa de reforma agrária por pressão do sindicatos, mas foi uma lei mais retórica do que real, não chegou a expropriar nem uma peseta (antiga moeda na Espanha). Havia tantos pré-requisitos e problemas burocráticos que, ao final, não serviu para absolutamente nada. Serviu simplesmente para que os terratenentes (“coronéis”) trocassem a titularidade da terra, dissimulando legalmente que eram grandes latifundiários.

Essa marcha entre agosto e setembro na Andaluzia foi a que reuniu mais apoiadores nos últimos anos. Como está a luta pela reforma agrária hoje?
Há uma mobilização que vem de baixo. O Estado diz que a reforma agrária é uma coisa do século XIX. Para nós, é do século XXI, é mais necessária do que nunca, é imprescindível. E é um tema que não deve preocupar somente o trabalhador rural, mas também aos consumidores. O que comemos todos os dias deve ser uma preocupação geral. E o que a marcha fez foi conectar as preocupações do campo com as da cidade, e, de alguma maneira, dar esse empurrão para que seja possível a reforma agrária em uma Europa que dá as costas para a terra.

Teria um efeito positivo nesse momento de crise na Europa?
Uma reforma agrária seria muito importante na Andaluzia, em Portugal... E sobretudo se fosse o início de um mundo diferente, onde os recursos se ponham a serviço do ser humano, onde a economia seja posta a serviço do homem e não o contrário.

No Brasil, a luta pela reforma agrária é liderada pelo MST. Qual é a sua avaliação do movimento?
É o movimento de massas mais importante que há no mundo ainda hoje. E penso que deve se potencializar e aprofundar para conseguir uma sociedade diferente, que, por certo, não é capitalista. E o MST é um movimento imprescindível no Brasil, país onde a terra está tão concentrada. Torço para que nenhuma burocracia o estrague e que o MST sempre funcione por seu objetivo primário.

A propósito de movimentos e de lutas no campo e na cidade, o mundo está atento aos Indignados, ou 15-M como dizem aqui na Espanha (referência ao 15 de maio de 2011, quando surgiu o movimento).
O 15-M foi um despertar espontâneo muito interessante. E há uma grande conexão conosco. Nesse momento, e depois dos últimos acontecimentos, dá para ver a possibilidade de unir uma boa parte da opinião pública e de setores produtivos para promover uma mudança real em todos os lugares.

Um dos dizeres do 15-M é “democracia real já”, pois o sistema atual não seria representativo nem democrático. As assembleias aqui em Marinaleda para discutir o orçamento e os problemas do município são uma tentativa desse ideal pregado pelos Indignados?
Nós levamos para a assembleia dos cidadãos qualquer tema ou problema do município. Em todos os assuntos - sindical, político... Temos um orçamento participativo, discutido bairro por bairro, até que em um encontro final de todos os vizinhos se toma a decisão sobre esse orçamento. Quando acertamos, acertamos muitos, e quando erramos, erramos muitos. Em qualquer caso, a melhor maneira de decidir é coletivamente. A democracia direta é um veículo imprescindível para uma nova esquerda e um novo mundo.

E qual é a sua avaliação do Fórum Social Mundial?
Me parece muito interessante esse encontro. Talvez, um defeito seja que se teoriza muito e se concretiza pouco. As reflexões são muito profundas e necessárias, porque anunciam um mundo melhor. Falta não apenas anunciar que um outro mundo é possível, mas também converter esse outro mundo em realidade.

O futuro do mundo depende muito do jovem. Uma questão que se coloca é como atrair esse jovem para a vida no campo, tendo em vista as atrações da cidade, carreiras universitárias... O campo será sempre uma segunda opção?
É possível que essa seja uma primeira opção do jovem sempre e quando se contemplem as mesmas possibilidades de desenvolvimento do ser humano em qualquer parte do país. Ou seja, que o mundo rural e o mundo urbano se assemelhem em termos de oportunidades. E que a agricultura e a agroindústria cumpram um papel muito mais decisivo do que o que tem nos dias de hoje.

O MST criou, em algumas comunidades do Brasil, escolas e universidades. Essa oportunidade de formação seria um exemplo disso?
Sim. Estive no Brasil visitando algumas comunidades, com um método próprio de ensino, com uma titulação própria. Essa é uma das grandes conquistas do MST. Que o assentado possa educar a sua gente com seus próprios valores, com sua maneira de entender a vida, para que essa cooperativa, esse assentamento tenham continuidade no futuro. Porque se há uma desconexão entre a rua e o meio, é impossível que se avance em um ideal de modelo agrícola diferente, com outros valores.

E o jovem de hoje está aberto a isso?
O jovem tem recebido muita carga da sociedade de consumo e do brilho da cidade. Faz falta uma revolução de valores - solidariedade, companheirismo. Aqui em Marinaleda tentamos através das assembleias, das manifestações, da rádio, da televisão, colocar esses novos valores que deem lugar a um ser humano novo. Se queremos um mundo diferente, precisamos não apenas de jovens, mas de jovens diferentes. Seria interessante que fizessem projetos pilotos no país em que se contemplassem todas as possibilidades de desenvolvimento que se encontra nas universidades. Para que seja atrativo, que as pessoas vejam que podem progredir no campo. Seria um exemplo de como conseguir um avanço no retorno do jovem ao campo.



sábado, 22 de setembro de 2012

COMO O AGRONEGÓCIO DISPUTA CORAÇÕES E MENTES





COMO O AGRONEGÓCIO DISPUTA CORAÇÕES E MENTES

Estudo analisa construção da campanha “Sou Agro” e sua tentativa de identificar latifúndio como algo associado à cultura brasileira

No ano de 2011 começou a ser veiculado nos meios de comunicação de massa brasileiros a campanha Sou Agro, um movimento articulado pelo agronegócio que visava criar uma imagem positiva do setor, ao associar tal modelo de produção agrícola como algo de mais modernoso já criado no âmbito da agricultura, com alto grau de produtividade, respeito ao meio ambiente, etc, além de procurar conectá-lo com o dia a dia da sociedade, em geral.
E é dentro deste tema, que a professora Regina Bruno, doutora em Sociologia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) analisa, por meio do artigo Movimento Sou Agro: marketing, habitus e estratégias de poder do agronegócio, tal estratégia do agronegócio junto aos grandes conglomerados de comunicação, com a finalidade de se criar um imaginário social longe de corresponder com a realidade deste modo de produção.
“É sobre o movimento Sou Agro concebido como lugar de institucionalização de interesses de grandes proprietários de terra, empresários rurais e agronegócio de que trata este artigo. Meu propósito é identificar qual imagem está sendo construída pelo movimento e a quem ele se dirige. Busco ainda entender as razões para um investimento midiático dessa natureza e identificar seus idealizadores”. Abaixo, leia parte do artigo:

Introdução


Em meados de julho de 2011, os meios de comunicação de massa veicularam filmes publicitários que ressaltavam o dinamismo do agronegócio e sua conexão com o dia a dia da sociedade. O horário nobre nos trouxe, como protagonistas dos filmes, Lima Duarte – de origem rural e ator de inúmeros papéis identificados com o campo, como “O Salvador da Pátria” – e Giovanna Antonelli, carioca, atriz global, representante de uma nova geração de atores. Nos anúncios, enquanto o primeiro louva a “Bendita Terra”, a segunda transformava, simbolicamente, sua geladeira em uma fazenda.

As cenas de Lima Duarte constroem simbolicamente a noção de “terra” ao envolver um conjunto de significações: terra, raiz da gente brasileira; terra fartura; terra respeito para quem trabalha; terra, lugar de todas as raças e alimentos do país e do mundo; terra Brasil – uma das maiores agronações do planeta; terra, motivo de orgulho de todos. Enfim, terra abençoada. Como imagem de fundo, uma representação do Brasil da fartura, da tecnologia sofisticada, da felicidade. Ao mesmo tempo, um Brasil sem gente, sem trabalhador, feito só de máquinas.
Giovanna Antonelli, por sua vez, chamou a atenção para a “fazenda” existente em todos os lares brasileiros. “Todo mundo tem uma fazenda. É só abrir a geladeira”, disse. O pomar, o gado de corte, a soja, além da plantação de algodão transformada em lençol e o canavial convertido em etanol. Tudo é agro. “É o Brasil pra frente”, enunciava Antonelli, em clara alusão ao jingle utilizado no rádio e na televisão para promover a Copa do Mundo de 1970, ocorrida durante o governo do general Emílio Garrastazu Médici (1969-1974). A música “Pra frente Brasil7” anunciava “uma mesma emoção (…) e um só coração” e se transformou em propaganda política dos governos militares.
As peças publicitárias, patrocinadas pela Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio (ABMR&A), fazem parte do Movimento de Valorização do Agro – Sou Agro. Este é definido como “uma iniciativa multisetorial de empresas e entidades de representação do agronegócio brasileiro e produtores rurais” que objetiva promover um “melhor conhecimento” sobre a importância do agronegócio de modo a reduzir o “descompasso existente entre a realidade produtiva atual e as percepções equivocadas sobre o universo agrícola”.
Para tanto, torna-se fundamental “reposicionar” a imagem do agronegócio nacional na sociedade, destacando suas contribuições econômicas e sua agenda social e ambiental de maneira a provar não ser destruidor do meio ambiente.
É sobre o movimento Sou Agro concebido como lugar de institucionalização de interesses de grandes proprietários de terra, empresários rurais e agronegócio de que trata este artigo. Meu propósito é identificar qual imagem está sendo construída pelo movimento e a quem ele se dirige. Busco ainda entender as razões para um investimento midiático dessa natureza e identificar seus idealizadores.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

O LADO NEGRO DO COMBUSTÍVEL VERDE




Entre a população indígena e o agronegócio, quem tem prioridade? O lucro, claro. Os índios Guarani Kaiowá lutam pela sobrevivência na região Sul do Mato Grosso do Sul, onde a prioridade é a monocultura da cana-de-açúcar, principal matéria-prima do tão falado etanol. Essa batalha é o tema do documentário “À Sombra de um Delírio Verde“, dirigido por An Baccaert, Cristiano Navarro e Nicola Mu.
Os Guarani Kaiowá são a maior população indígena ainda existente no Brasil. São 40 mil pessoas que vivem em um espaço correspondente a menos de 1% do seu território original. Hoje, a luta não é contra o colonizador, e sim contra as multinacionais que usam milhares de hectares para plantar cana-de-açúcar. O poder das multinacionais sobre o território é apoiado pelo Governo, que tem imenso interesse no combustível “limpo” e ecologicamente correto que é o etanol.
No entanto, tal negligência das autoridades com relação aos indígenas provocou a atual epidemia de desnutrição que atinge as crianças Guarani Kaiowá. Sem espaço para viver de suas atividades de subsistência, os adultos e adolescentes são obrigados a aceitar o trabalho desumano dos canaviais, constantemente autuados pelo Ministério Público do Trabalho devido às práticas de trabalho infantil e escravo. Os que resistem e enfrentam os grandes fazendeiros são praticamente condenados à morte.
O premiado “À Sombra de um Delírio Verde” mostra o lado negro da febre do ouro verde (nome dado à cana-de-açúcar) e busca chamar atenção para o drama dos Guarani Kaiowá. Até quando o lucro vai se sobrepor aos direitos humanos?

Veja o filme: “À Sombra de um Delírio Verde

sábado, 15 de setembro de 2012

O CUSTO SOCIAL DA ESPECULAÇÃO ALIMENTAR




Glenn Ashton
do site The South African Civil Society Information Service
Traduzido pelo Canal Ibase

Os preços dos alimentos estão rapidamente indo em direção a um novo recorde, e há muito mais em jogo do que uma simples seca no Centro-Oeste dos EUA. Há implicações sérias, especialmente para nações com altas taxas de desigualdade e pobreza. É quase certo que iremos enfrentar uma fome em escala global potencialmente catastrófica nas próximas décadas.
A principal razão pela qual já existem mais de sete bilhões de pessoas na Terra é em grande parte devido ao surgimento de duas tecnologias distintas. Em primeiro lugar, os combustíveis fósseis baratos nos permitiram cultivar alimentos em escalas industriais. Atualmente precisamos de cerca de dez calorias de energia de combustíveis fósseis para produzir uma caloria de comida. Há um século, cada caloria de energia gasta produzia duas calorias de alimentos. Em segundo lugar, os avanços na área da saúde, principalmente antibióticos e vacinas, têm aumentado a duração da vida humana.
É um desafio crescente alimentar essa população que aumenta exponencialmente. Nós produzimos o bastante para todos na Terra terem o suficiente de comida, mas, apesar desta abundância, uma proporção significativa de pessoas não tem dinheiro para se alimentar de maneira adequada. Por quê?
Há três razões principais para isso. Em primeiro lugar, a distribuição desigual da riqueza. Em segundo lugar, o consumo de carne tem crescido à medida que a riqueza aumenta. A área de pastagem para a produção de carne, principalmente bovina, utiliza mais de um quarto da superfície livre de gelo da Terra. Além disso, mais de um terço de todas as terras é usado para cultivar colheitas para a alimentação do gado. Esta é produzida por meio de práticas agrícolas industriais com utilização intensiva de energia.
Em terceiro lugar, os riscos associados a fontes de energia não renováveis incentivou os governos ricos a promover a produção e o consumo de “biocombustíveis”. Estes são produzidos a partir de recursos agrícolas, como cana-de-açúcar, beterraba, milho, soja e oleaginosas, como o dendê e a canola.
Este foco em biocombustíveis – que oponentes preferem chamar de agrocombustíveis devido a sua propensão de desviar os escassos recursos agrícolas em direção à produção de combustível – causou uma mudança sem precedentes no foco na produção agrícola dos alimentos para o plantio de safras destinadas à produção de combustíveis.
Como resultado, faixas de ecossistemas sensíveis foram destruídas para serem plantadas por monoculturas como dendê, cana-de-açúcar, milho e soja. Altos preços do petróleo deram um incentivo econômico potente para sustentar essa mudança ecologicamente desastrosa. Essa destruição está ocorrendo desde em selvas da Indonésia – deslocando espécies emblemáticas como orangotango – até a África Ocidental, onde as comunidades locais são expulsas a fim de atrair “o investimento estrangeiro” e plantar safras para a produção de agrocombustíveis.
A produção de biocombustíveis tem um claro impacto sobre as reservas mundiais de alimentos, que estão atualmente se aproximando de baixas históricas. No ano passado, quase 40% da safra de milho dos EUA se tornou combustível etanol. Como os EUA são o maior produtor mundial de milho, isto tem sérias implicações para o comércio mundial de alimentos. Isso é especialmente verdade à luz da grave seca deste ano em todo o Centro-Oeste americano. Os preços do milho atingiram níveis recordes, quase o dobro do ano passado.
Altos preços do petróleo vão manter a demanda por etanol de milho, perpetuando a insanidade da utilização de alimentos como combustíveis. O comércio global de commodities destas culturas é dominado por três empresas – Cargill, Bunge e Archer Daniel Midland – cada uma profundamente envolvida tanto na produção de etanol quanto na cobertura de mercado e especulação.
Essa mercantilização dos alimentos deixa a segurança alimentar à mercê do mercado. Não há nenhuma supervisão central global ou planejamento para garantir estoques de alimentos suficientes. O alimento é controlado pelo mercado, e não pela lógica, e certamente não pela benevolência.
Uma solução proposta pelos interesses neoliberais, como o G8 e o elitista Fórum Mundial Econômico, é modernizar a agricultura em todo o mundo em desenvolvimento, particularmente na África, onde a produção tem ficado historicamente defasada das normas internacionais. Esta solução segue o modelo da imposição de alto custo e de práticas agrícolas intensivas, dependentes de fertilizantes, de sementes híbridas e geneticamente modificadas, do aumento da mecanização e do uso de pesticidas e produtos químicos sobre vulneráveis ​​sistemas econômicos e agrícolas.
Os pobres tornam-se inevitavelmente vítimas dessa desigualdade. Camponeses são forçados a recorrer a empréstimos para garantir a sua posição sobre a esteira industrial agrícola. Quando as culturas falham, sua terra é perdida para interesses industriais agrícolas consolidados, que espremem a terra para obter lucros ao custo da biodiversidade e da estabilidade social.
Enormes faixas de terra já foram absorvidas em ocupações de governos estrangeiros, entidades privadas e especuladores para a plantação de biocombustíveis ou de alimentos para animais. Agricultores deslocados migram para áreas urbanas em busca de trabalho, já que seus empregos são perdidos por conta da mecanização.
A maioria pobre é, consequentemente, forçada a uma realidade cada vez mais desoladora para aceitar essas soluções para a fome ditadas pelo mercado, que por sua vez aniquila a delicada dinâmica social e econômica sustentada por incontáveis ​​gerações.
No oeste da África do Sul, as famílias gastam 15% da renda em alimentos – no sul esse percentual sobe para 80%. No entanto, o modelo econômico dominante afirma que, em pequena escala, fazendeiros autossuficientes não fornecem qualquer rendimento para pagar impostos ou acrescentam algo à balança nacional de pagamentos. Portanto, o dogma neoliberal insiste que esses agricultores “inúteis” modernizem e adotem a agricultura intensiva. E, lembrem-se, esses agricultores “sem valor” representam quase um terço da população do mundo e alimentam ainda mais.
Estas mudanças somam-se às já profundas ameaças para a segurança alimentar, para a coesão social e para metas de desenvolvimento do milênio, como a redução da pobreza. Ironicamente, projetos de agricultura de pequeno porte são muito mais resistentes à instabilidade climática do que o modelo industrial intensivo que está sendo promovido.
Por sua vez, a mudança climática está cada vez mais relacionada à instabilidade na produtividade agrícola. Níveis acentuadamente elevados de dióxido de carbono e, mais recentemente, de metano, lançados enquanto as bordas do Ártico derretem rapidamente, exacerbaram essa incerteza. Esta espiral de feedback coloca a produção agrícola em outros riscos diretos.
A mudança climática é mais sobre os eventos climáticos cada vez mais extremos e imprevisíveis do que simplesmente o “aquecimento.” Os arautos destas mudanças são eventos como secas no Centro-Oeste dos EUA, Rússia, Sul da Ásia, o derretimento do gelo e da calota polar do Ártico e inundações no Paquistão, Birmânia e Coreia do Norte.
Adicione a esta mistura volátil os instintos predatórios dos negociantes de commodities que buscam lucros de curto prazo na economia especulativa e, é claro, os pobres que estão expostos a níveis crescentes e cínicos de risco. Ativismo contra esta exploração fizeram com que o Commerzbank e vários outros bancos alemães cessassem esse comércio imoral. No entanto, comerciantes especulativos de outros lugares não têm tais escrúpulos.
Todos esses fatores cumulam numa tempestade perfeita. Os preços do milho e da soja estão em níveis recordes, acima até mesmo dos preços que chegaram em 2008, com a bolha especulativa. O trigo está indo na mesma direção, como muitas outras culturas importantes.
Todos nós vamos sentir o impacto desta tempestade perfeita, mas, mais uma vez, serão os mais pobres entre nós os mais seriamente afetados. Isto tem sérias implicações para a estabilidade social, especialmente nas nações assoladas pelos desafios da pobreza e da desigualdade.
Tradução: Isis Reis

DESONERAÇÃO DA FOLHA DAS EMPRESAS E NOVOS HORIZONTES PARA A TERCEIRIZAÇÃO





A cada quatro anos, o ano é acrescido de um dia a mais no calendário – o ano bissexto, para corrigir um erro de cálculo na duração do dia.
A órbita do cometa Halley, impõe a ele que passe pela Terra, a cada 76 anos, eu já vi uma vez, provavelmente não verei a segunda vez.
Eventos raros e/ou cuja periodicidade impõe um lapso grande de tempo são sempre lembrados nos jornais quando ocorrem.
Incrivelmente, nosso legislador federal teve a ousadia (e inteligência) de propor a desoneração da folha de pagamento, de 20% para 1 ou 2%, atendendo assim, aos reclamos da ordem produtora. Mas foi além, foi esperta, deu essa desoneração para muitos setores, e não deu para as empresas PRESTADORAS de mão de obra, ou seja, as terceirizadoras.
Com a desoneração dos 20% de contribuição previdenciária incidentes sobre a folha de pagamento, as empresas podem começar a repensar e, quem sabe, reverter a crescente onda de terceirização, aliás como já noticiam alguns sites e jornais.
O cálculo é simples: ao terceirizar as empresas se obrigam a pagar às prestadoras de serviços um valor que deverá incluir as remunerações dos trabalhadores colocados à sua disposição e o lucro destas. Detalhe: as empresas prestadoras não estão incluídas dentre as desoneradas, ou seja continuaram a pagar a seus empregados os 20% sobre sua folha.
A partir de agora, portanto, em se tratando de atividade essencial (ainda que de forma secundária) para a empresa, será muito mais interessante contratar diretamente o trabalhador, inalterando o valor da contribuição previdenciária (que é sobre o faturamento), do que se sujeitar a arcar, além da remuneração do trabalhador terceirizado, com o percentual de 20% referente aos encargos previdenciários e o lucro da empresa prestadora.
É esperar para ver…


TST DEFINE REGRAS E AMPLIA DIREITOS DE TRABALHADORES




TST (Tribunal Superior do Trabalho) revisou vários entendimentos sobre regras trabalhistas, o que, na maioria dos casos, aumentou a segurança dos trabalhadores.
Durante toda a semana, o tribunal reviu súmulas e orientações para jurisprudência -entendimentos que norteiam as decisões de futuros conflitos. Ao todo, 43 temas foram discutidos. Em 38 houve algum tipo de alteração.
A reportagem é de Júlia BorbaPaulo Muzzolon e Lucas Sampaio e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 15-09-2012.

Os novos entendimentos já estão valendo, segundo o TST. Algumas das principais decisões foram:

Celulares
Funcionários em plantão, longe da empresa, com o celular ligado e disponíveis para convocação pelo empregador estão em sobreaviso.
Eles terão direito a receber, por hora, o equivalente a um terço de sua hora de trabalho convencional.

Grávidas
Foi garantida a estabilidade para trabalhadoras, em contratos temporários, que ficarem grávidas. O empregador terá de garantir a vaga até o fim da gestação e assegurar cinco meses de licença maternidade.
Atualmente, essa regra só valia para mulheres contratadas pelas empresas por tempo indeterminado.

Aviso prévio
A nova lei do aviso prévio vale apenas nas rescisões que forem feitas a partir da entrada em vigor da nova lei, em outubro de 2011. Ela amplia o prazo do aviso de 30 dias para até 90 dias, proporcional ao tempo de trabalho (a cada ano trabalhado, três dias a mais no aviso).
Centrais sindicais queriam que a lei fosse retroativa, mas o TST decidiu em contrário.

Acidentados e afastados
Trabalhadores que sofrerem acidente de trabalho terão direito a permanecer no emprego pelo período de pelo menos um ano após a sua recuperação.
A regra vale sempre que houver um contrato formal, ainda que de poucos meses.
O trabalhador afastado do emprego por auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez tem direito à manutenção de seu plano de saúde ou assistência médica pago pelo empregador.

Doença grave
Quando um funcionário portador de doença grave, como HIV, for demitido e alegar preconceito ou estigma, caberá ao patrão provar que não o dispensou em razão de seu estado de saúde.

Jornada 12 por 36
O TST também entendeu que a jornada conhecida como 12 por 36 -ou seja, 12 horas de trabalho a por 36 horas de descanso- é válida, desde que em caráter excepcional.
Segundo nova súmula, essa jornada deve estar prevista em lei ou ajustada por meio convenção coletiva.
O trabalhador não tem direito ao adicional para as duas últimas horas de trabalho, mas deve receber remuneração em dobro sempre que trabalhar em feriados.

Celular só dá adicional se uso for em plantão
O entendimento do TST (Tribunal Superior do Trabalho) é que os funcionários que estão à disposição da empresa fora do horário de trabalho não estão em momento de descanso, porque têm a liberdade restringida, não podendo viajar, por exemplo, para se manter no sobreaviso.
O tribunal defende, no entanto, que não se enquadram na mesma situação de sobreaviso aqueles profissionais que recebem um telefone ou um computador de seu empregador para serem localizados a qualquer momento em caso de emergência.
Para a corte, o simples fato de a empresa poder precisar do funcionário e ligar para ele, eventualmente, não significa que há sobreaviso.
O que caracteriza essa situação é a definição, pelo empregador, do período em que essas chamadas poderão ocorrer -ou seja, quando há um prazo determinado para que esse plantão ocorra.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

EMPRESA É CONDENADA POR DISCRIMINAR EMPREGADO EM RAZÃO DA ORIGEM



A rede de farmácias paulista Raia S/A foi condenada a pagar indenizações por danos moral e social no valor de R$ 13,4 mil a um empregado catarinense discriminado em razão da sua origem. O juiz Luciano Paschoeto, da 1ª Vara do Trabalho de Florianópolis, considerou na sentença as ofensas feitas por superiores hierárquicos, depreciativas ao estado de origem do trabalhador.
O autor alegou na ação que a gerente e a subgerente costumavam dizer que "catarinense não trabalha, paulista é que sabe trabalhar”, sendo ele o único catarinense no grupo. Para o juiz, ofensa desse teor, sendo o autor natural de Santa Catarina, configura dano moral. Uma testemunha do autor comprovou que a gerente falava junto aos funcionários do balcão que os catarinenses não tinham vontade de trabalhar e que, em São Paulo, era diferente, pois as pessoas trabalhavam. 
O magistrado também registrou que em outro processo contra a mesma empresa, cujo objeto sequer tinha relação com ofensas ao povo catarinense, presenciou depoimento em audiência no sentido de que a mesma gerente teria afirmado que “o pessoal daqui (Santa Catarina) tem que ir para São Paulo aprender a trabalhar, pois o povo daqui não gosta de trabalhar”. Para o julgador, ficou comprovado que o autor foi ofendido em sua moral, num procedimento tipicamente discriminatório ocorrido dentro do ambiente de trabalho, causando dano moral que demanda reparação. “Atacar o povo catarinense, sem qualquer fundamento ou razão, explicita uma clara afronta a um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, mais precisamente o de 'promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação'”, registra a sentença. 
O juiz Paschoeto também concluiu que a discriminação atinge e contamina o ambiente de trabalho e os trabalhadores em geral, e que a repercussão social do ato ilícito agrava o dano quando se transcende a órbita individual do agredido. Diante disso, fixou a indenização por danos morais em R$ 3,4 mil, conforme o pedido. 

Dano social

A condenação não ficou apenas no aspecto do dano moral. A empresa também foi condenada por dano social em mais R$ 10 mil. O magistrado interpretou que o ato agressivo ultrapassou o limite individual, atingindo a sociedade catarinense como um todo, pois a evidente propagação do ato ofensivo fez com que uma coletividade fosse atingida pela discriminação e pelo desprestígio. 
Por isso, entendeu necessária uma sanção de ofício do Estado para preservar a ordem jurídica. Segundo Paschoeto, o juiz deve “reconhecer, obrigatoriamente, mesmo sem provocação, o dano social, porque o processo possui uma função extraprocessual de extrema relevância, qual seja, a de transmitir aos litigantes 'in genero' a ideia de como o Judiciário interpreta as leis e como devem orientar seus comportamentos, de forma a evitar o acionamento judicial". 
A indenização deverá ser revertida para a Fundação Franklin Cascaes, que atua no resgate da história e da memória de Florianópolis, promovendo e divulgando as manifestações culturais tradicionais e contemporâneas, além de preservar o patrimônio cultural material e imaterial da cidade.
A ré propôs embargos de declaração que não foram acolhidos. Ainda cabe recurso da decisão para o TRT-SC.

Fonte: Assessoria de Comunicação do TRT-SC - (48) 3216.4320/4306/4303

Publicado no site do TRT SC –


"A AGROINDÚSTRIA CANAVIEIRA E A CRISE ECONÔMICA MUNDIAL"




Informamos que foi publicado o novo relatório da Rede Social, disponível em: http://www.social.org.br/relatorioagrocombustiveis2012.pdf

TRABALHADOR RURAL REVERTE FRAUDE EM PEDIDO DE DEMISSÃO HOMOLOGADO NO SINDICATO


A extinção ou rescisão do contrato de trabalho, como regra, gera efeitos financeiros. Tais efeitos correspondem a direitos que as normas jurídicas garantem ao trabalhador e, no caso de morte deste, aos seus dependentes. Quando o contrato extinto tiver sido firmado há mais de um ano, o ato de pagamento e recebimento das verbas rescisórias exige uma formalidade especial denominada assistência, que confere validade jurídica aos pagamentos. A assistência na extinção do contrato de trabalho foi prevista inicialmente no art. 500 da CLT, com o objetivo de preservar e garantir a autenticidade do pedido de demissão do trabalhador que gozava de estabilidade no emprego. A partir de 1962, todavia, iniciou-se um ciclo de produção legislativa que culminou na extensão da obrigatoriedade da assistência para todos os contratos de trabalho extintos após um ano de vigência, na fixação de prazos para pagamento das verbas rescisórias, de penalidades pelo seu descumprimento, bem como na expressa proibição de cobrança para a prestação da assistência. O objetivo da assistência é, assim, garantir o cumprimento da lei e o efetivo pagamento das verbas rescisórias, bem como orientar e esclarecer as partes sobre os direitos e deveres decorrentes do fim da relação empregatícia.
A legislação confere essa “homologação” às delegacias do trabalho ou aos sindicatos de cada categoria. Porém, muitas vezes não tem delegacia do trabalho no município do empregado demitido e o sindicato é “pelego”. É esse o caso abaixo relatado.



TRABALHADOR RURAL REVERTE FRAUDE EM PEDIDO DE DEMISSÃO HOMOLOGADO NO SINDICATO

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho por unanimidade negou provimento ao recurso da Usina Central do Paraná S.A. pelo qual a empresa buscava reformar decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) que converteu o pedido de demissão de um trabalhador em rescisão indireta do contrato de trabalho após comprovar que o ato de rescisão do contrato de trabalho se deu mediante fraude. A decisão determinava o pagamento das verbas decorrentes da conversão.
O processo trata de pedido de um trabalhador rural, que foi levado ao sindicato representativo de sua categoria para homologar a rescisão de seu contrato de trabalho. O pedido do trabalhador tinha como fundamento o descumprimento reiterado da empresa com suas obrigações contratuais. O sindicato, porém, homologou a demissão do trabalhador como se ela tivesse ocorrido a pedido do trabalhador.
Na inicial o trabalhador pedia a conversão de sua demissão para rescisão indireta de trabalho e o pagamento das verbas decorrentes desta. A Vara do Trabalho converteu o pedido de demissão em rescisão indireta do contrato de trabalho.

Regional

O Regional, ao analisar o recurso da Usina contra a sentença, observou que após a obtenção da prova oral, pôde-se concluir que de fato havia sido do trabalhador a iniciativa de rescindir o contrato de trabalho e que isto teria ocorrido, em virtude de falta grave cometida pelo empregador. A esta mesma conclusão chegou o Regional ao analisar o Termo de Rescisão de contrato de trabalho que foi juntado aos autos, onde está escrito "pedido de dispensa", não fazendo qualquer menção a conduta faltosa da Usina.
Para o Regional ficou demonstrada a fraude diante da "hipossuficiência e a simplicidade" do trabalhador que são "flagrantes e incompatíveis" com a forma com que ele apresentou o seu pedido de demissão. Da análise da documentação fica demonstrada toda a cautela que houve em se demonstrar a "espontaneidade" do ato, cita como exemplo, o tipo de linguagem usada, o uso do computador para redação do Termo e as diversas menções a dispositivos legais. Para o Regional o conjunto de provas mostra que o documento de rescisão contratual foi confeccionado pelos responsáveis da usina, com a anuência do sindicato.
A decisão regional registra que considerou ineficaz o pedido do trabalhador, por haver ficado demonstrado que no decorrer dos anos houve o descumprimento de forma reiterada de cláusulas de seu contrato de trabalho tais como: atraso no pagamento de salários, ausência de pagamento de horas extras e de percurso, além do não recolhimento de FGTS. Por estes fundamentos entendeu pela ineficácia do comunicado de demissão do trabalhador.

TST

O relator na Primeira Turma, ministro Walmir Oliveira da Costa, verificou que a defesa da Usina não conseguiu demonstrar que a decisão de não seguimento do recurso de revista ao TST tenha violado dispositivo de lei federal, da Constituição da República ou mesmo contrariedade à Súmula do TST conforme orienta o artigo 896 da CLT. Observou também que não há demonstração de divergência jurisprudencial, pelos acórdãos trazidos no recurso. 
Para Walmir Oliveira o recurso da Usina baseado na alegação de que as parcelas devidas ao trabalhador estariam todas quitadas por ter sido o termo de rescisão do contrato de trabalho homologado mediante assistência sindical - com amparo no disposto na Súmula n° 330 do TST. "Além de juridicamente inconsistente, porquanto demonstrada a fraude à legislação trabalhista (...) encontra óbice intransponível na Súmula n° 126 do TST", por não ser possível o que fora corretamente aplicada na decisão regional, observou o ministro. Seguindo o voto do relator, a Turma por unanimidade negou provimento ao Agravo de Instrumento.

Destaque

Na sessão de julgamento da Primeira Turma, o ministro Lelio Bentes Corrêa destacou o importante papel desempenhado pelo Regional, que extraiu da prova produzida a efetiva fraude na suposta demissão a pedido, bem como a constatação das graves violações às obrigações contratuais cometidas pela empresa. Salientou a destacada posição Regional ao afastar as alegações da empresa de que pelo fato de as violações ao contrato de trabalho estarem ocorrendo há muito tempo, este fato significaria o perdão tácito do empregado. Neste ponto salientou inexistir perdão tácito do trabalhador quando há violação reiterada de seus direitos. "É importante que a sociedade brasileira se conscientize da absoluta indispensabilidade de guardar a observância aos princípios da boa-fé e da ética contratual" concluiu.
(Dirceu Arcoverde / RA)

terça-feira, 11 de setembro de 2012

LIMITAÇÃO DE USO DO BANHEIRO GERA INDENIZAÇÃO DE R$ 15 MIL



 

A Contax S.A. e a Bradesco Auto/Re Companhia de Seguros foram condenadas a indenizar um trabalhador em R$15 mil a título de dano moral por limitar o uso do banheiro durante o expediente. Além disso, ambas serão obrigadas a pagar ao funcionário vinte minutos extras por dia trabalhado, inclusive nos feriados, a partir de setembro de 2007, e seus reflexos.
O autor, contratado pela Contax (1ª reclamada) para prestar serviço de teleatendimento à Bradesco (2ª reclamada), afirmou nos autos que sofreu abalo psicológico em razão das humilhações geradas pela 1ª ré, motivadas pelas restrições ao uso do banheiro. Os depoimentos evidenciaram a prática da referida empresa de limitar o acesso ao local e confirmaram a existência de uma fila de espera para sua utilização.
“O dano moral configura-se por um sofrimento decorrente de lesão de direitos não-patrimoniais, caracterizado por excesso, abuso e tratamento humilhante sofrido pelo empregado, que provoque grave abalo a sua reputação. Desse modo, do conjunto probatório se extrai que a restrição no uso do banheiro, que decorria de uma organização interna da ré, gerava constrangimentos ao autor, a ensejar a condenação ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$15.000,00”, sentencia o relator do acórdão, desembargador Célio Juaçaba Cavalcante.
No mesmo processo, o autor sustentou, ainda, que foi contratado para trabalhar por apenas seis horas diárias. No entanto, a partir de setembro de 2007, afirmou que trabalhava seis horas e vinte minutos por dia de segunda a sábado, inclusive feriados, pleiteando, assim, o pagamento de todo o período extra laborado. A 1ª reclamada sustentou que esses vinte minutos tinham o intuito de propiciar o intervalo para repouso e alimentação. Porém, a mesma não comprovou que eram concedias essas pausas.
Sendo assim, a 10ª Turma decidiu por condenar a Contax e a Bradesco, subsidiariamente, ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$15.000,00, bem como pagamento de vinte minutos extras por dia trabalhado, inclusive nos feriados, a partir de setembro de 2007, com o adicional legal, e seus reflexos.
Nas decisões proferidas pela Justiça do Trabalho são admissíveis os recursos enumerados no art. 893 da CLT.

Fonte: TRT-1

"MOENDO GENTE" MOSTRA AS CONDIÇÕES DE TRABALHO NOS FRIGORÍFICOS DO BRASIL




Investigação realizada pela Repórter Brasil aponta os problemas à saúde e segurança dos empregados das principais indústrias de carnes do país.
A reportagem é do sítio Repórter Brasil, 10-09-2012.

A rotina dos trabalhadores da indústria de abate de aves, suínos e bovinos envolve inúmeros riscos devido ao manuseio de instrumentos cortantes, a pressão por altíssima produtividade e, não raro, jornadas exaustivas em ambientes frios e insalubres. Produzida pela Repórter Brasil, a investigação Moendo Gente (www.moendogente.org.br) mostra os maiores problemas da indústria dos frigoríficos, um dos principais setores do agronegócio nacional. Atualmente, emprega mais de 750 mil pessoas e, em 2011, chegou a exportar o equivalente a US$ 15,64 bilhões em carnes.
O Moendo Gente relata problemas em 24 plantas frigoríficas pertencentes às três principais empresas que abastecem nossos supermercados e fazem do país o líder mundial na exportação de proteína animal: JBS, Marfrig eBrasil Foods. Em 2011, a Repórter Brasil lançou um documentário mostrando o retrato do trabalho em frigoríficos, Carne, Osso. Clique aqui para assistir ao trailer do filme.

Problemas de saúde

Na unidade de Rio Verde (GO) da Brasil Foods, segundo levantamento do Ministério Público do Trabalho (MPT), cerca de 90 mil pedidos de afastamento foram registrados entre janeiro de 2009 e setembro de 2011. É como se a cada 10 meses todos os 8 mil empregados do frigorífico tivessem que se ausentar por ao menos uma vez devido a problemas de saúde relacionados ao trabalho.
Os afastamentos por distúrbios osteomusculares (os chamados DORT) foram os mais recorrentes – uma média altíssima de 28 atestados por dia, ou 842 por mês. Já na unidade de Barretos (SP) da JBS, 14% dos aproximadamente 1.850 funcionários estão permanentemente afastados do trabalho devido a acidentes e doenças ocupacionais e sobrevivem com o benefício pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Só no primeiro semestre de 2011, registraram-se 496 pedidos de afastamento temporário (com menos de 15 dias) por conta de distúrbios psíquicos e problemas esquelético-musculares.
Em 2011, a Seara (empresa do grupo Marfrig) foi condenada a pagar uma indenização de R$ 14,6 milhões por danos morais coletivos causados aos trabalhadores na unidade de Forquilhinha (SC). A Justiça determinou também que a Seara conceda pausas para “recuperação térmica” de 20 minutos a cada 1 hora e 40 minutos de trabalho. A mesma sentença obriga ainda o frigorífico a liberar a ida dos trabalhadores ao banheiro, sem que seja necessária autorização prévia de um superior.

Atividade de alto risco

Uma das características do trabalho em frigoríficos é a elevada carga de movimentos repetitivos. Trabalhadores das indústrias de aves desossam, no mínimo, 4 coxas de frangos por minuto. Nessa função, há funcionários que realizam até 120 movimentos diferentes em apenas 60 segundos, enquanto estudos ergonômicos apontam que o limite de ações por minuto deve ficar na faixa de 25 a 33 movimentos por minuto para evitar o aparecimento de doenças osteomusculares.
Fiscalizações feitas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) vêm constatando prolongamento irregular da jornada de trabalho, com expedientes que chegam a superar 15 horas diárias.
Especialistas em saúde do trabalho afirmam que as lesões por esforços repetitivos têm como um dos fatores facilitadores e agravantes a exposição a baixas temperaturas.  Além disso,  o trabalho contínuo com facas, serras e outras ferramentas afiadas, aliado a jornadas exaustivas, elevam o risco de acidentes da atividade.
Órgãos governamentais e autoridades competentes estão cientes dos riscos que o trabalho em frigoríficos gera à saúde de seus empregados. Segundo dados oficiais do Ministério da Previdência Social (MPS), quando se comparam os problemas de saúde gerados especificamente pelo abate e processamento de carne com os danos provocados por todos os demais segmentos econômicos brasileiros, o resultado da matemática é assustador.
No abate de bovinos, ocorrem duas vezes mais traumatismos de cabeças e três vezes mais traumatismos de abdômen, ombro e braço que em outras atividades. O risco de sofrer uma queimadura é seis vezes superior.
No abate de aves, a chance de um trabalhador desenvolver um transtorno de humor, como uma depressão, é 3,41 vezes maior. No abate de aves e suínos, o risco de sofrer uma lesão no punho ou nos plexos nervosos do braço é 743% maior.

Baixas indenizações

Funcionários de frigoríficos que se acidentam gravemente ou desenvolvem doenças ocupacionais têm sido contemplados pela Justiça com indenizações por danos morais comparáveis às recebidas por cidadãos que tiveram seus nomes inseridos indevidamente no cadastro de “maus pagadores” da Serasa Experian.
Para especialistas da área, as condenações impostas pelo Poder Judiciário aos frigoríficos resultam em indenizações de valor muito baixo que, em vez de inibir as práticas nocivas no setor, acabam permitindo que novos acidentes ocorram.
Em Goiás, por exemplo, um trabalhador de uma planta industrial da Marfrig teve de ser submetido a uma cirurgia depois que um corte profundo em seu braço esquerdo atingiu nervos e tendões, prejudicando a mobilidade de sua mão. Por não fornecer os devidos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), o frigorífico foi condenado a arcar com os custos da cirurgia e a pagar uma indenização de R$ 5 mil por danos morais ao empregado.
Também em Goiás, uma cliente processou um banco que levou seu nome à Serasa Experian e foi contemplada com uma indenização de R$ 10 mil por danos morais.

Legislação específica para o setor

A legislação trabalhista do Brasil já prevê uma série de medidas que, se devidamente aplicadas, contribuiriam para a proteção da saúde dos empregados do setor de frigoríficos. O artigo 253 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), por exemplo, determina a realização de intervalos de 20 minutos a cada 1 hora e 40 minutos de trabalho para amenizar os efeitos do frio. Há normas semelhantes para mitigar os problemas gerados pelos movimentos repetitivos. Só que as empresas nem sempre cumprem essas determinações e, por essa razão, vêm sendo acionadas judicialmente pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).
Desde 2010, a Secretaria Nacional de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (SIT/MTE) vem debatendo com representantes de empresas, trabalhadores e órgãos competentes (como o Ministério Público do Trabalho) o texto de uma Norma Regulamentadora (NR) que vai disciplinar o trabalho em frigoríficos.
Se aprovada, a NR fornecerá detalhes sobre o fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) aos trabalhadores; a adequação dos postos de trabalho, levando em conta os instrumentos (facas, serras)e o mobiliário (mesas, esteiras); a velocidade e o ritmo de trabalho, e a concessão de pausas aos empregados. Esse último ponto é o que tem sido objeto de mais controvérsias nas discussões sobre a nova NR, que pode ser aprovada ainda em 2012.

Mercado global: o que pensa quem consome a carne brasileira

Atualmente, a carne brasileira é vendida em mais de 150 países. Apesar dos graves problemas trabalhistas em suas fábricas, Brasil Foods, JBS e Marfrig se valem de parcerias com gigantes do varejo para escoar seus produtos no Brasil e no exterior. A Repórter Brasil investigou ainda os elos que ligam esses três grupos frigoríficos às maiores redes mundiais de fast-food (McDonald’s, Subway, Burger King, KFC e Pizza Hut) e aos dez maiores varejistas globais com atuação no setor alimentício (Walmart, Carrefour, Tesco, Metro, Kroger, Lidl, Costco, Walgreens, Aldi eTarget).
A unidade de Naviraí (MS) da JBS é uma das plantas industriais da empresa que abastecem lojas brasileiras do Walmart. Registros de desmaios e queixas de mal-estar entre trabalhadores levaram o Ministério Público do Trabalho (MPT) a ajuizar um pedido de interdição do setor de abate local, em novembro de 2010.
No Oriente Médio, o Carrefour comercializa carne halal (preparada de acordo com os preceitos islâmicos do Alcorão), proveniente da unidade de Dois Vizinhos (PR) da Brasil Foods (BRF). Em 2011, a Justiça do Trabalho condenou a BRF por terceirização ilícita e por submeter a “condições absolutamente indignas” os trabalhadores muçulmanos empregados localmente na produção desse tipo de item.
A unidade da Marfrig em Hulha Negra (RS) é responsável pela fabricação de carnes enlatadas “marca própria” daTesco, o maior varejista do Reino Unido. Uma inspeção do Ministério Público do Trabalho (MPT), realizada em dezembro de 2011, constatou que 12% dos empregados locais estavam afastados por acidentes ou doenças ocupacionais.
Todos os varejistas e redes de fast-food foram convidados a se manifestar sobre os problemas  identificados em operações de seus fornecedores. O Moendo Gente traz as respostas daqueles que optaram por se posicionar.