21 de março de 2013
Por José Coutinho Júnior
Da Página do MST
A
bancada ruralista pretende alterar a legislação trabalhista rural. De acordo
com Vagner Freitas, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), o que
os ruralistas querem não é o bem do trabalhador rural, e sim lucrar ao custo do
bem estar dos trabalhadores.
“Eles
Pretendem flexibilizar a legislação para construir relações de trabalho cada
vez mais frágeis no campo, tudo isso para economizar com a mão-de-obra que já é
barata. Confira abaixo a entrevista de Vagner Freitas sobre a legislação trabalhista
rural e a ofensiva da bancada ruralista:
Como você analisa a legislação rural brasileira?
A
legislação trabalhista rural brasileira tem sido aprimorada com o passar dos
tempos e representa um instrumento importantíssimo para o assalariado e assalariada
rural. Esse aprimoramento, entretanto, não tem acontecido na velocidade que
necessitam os assalariados e assalariadas rurais, fazendo permanecer no campo
situações como a submissão de trabalhadores a condições análogas às de
escravo.
Vários
foram os avanços, como a NR-31, que estabeleceu as regras de saúde e segurança
no campo, e a Lei 11.718/2008, que estabeleceu os contratos de curta duração.
No
entanto, as aplicações dos contratos de safra no meio rural continuam
acontecendo de forma abusiva, sendo utilizados, na grande maioria das vezes,
para fraudar contratos de trabalho por prazo indeterminado, retirando do
trabalhador rural direitos como seguro desemprego, aviso prévio, multa do FGTS,
entre outros.
Há,
ainda, a pendência na votação da PEC do Trabalho Escravo, que vem tramitando no
Congresso de forma extremamente lenta, colaborando para a existência de
trabalhadores em situação de trabalho escravo.
Apesar da legislação, o trabalho rural se encontra
precarizado?
Sim.
Mesmo com os avanços, não há fiscalização capaz de garantir o cumprimento
do
que determinam as normas existentes. Da mesma forma, não há um nível de
conhecimento
dos próprios trabalhadores sobre os seus direitos, já que inexistem campanhas
permanentes do Poder Público de conscientização de trabalhadores e
trabalhadoras rurais.
Este
cenário faz com que a maioria dos trabalhadores, cerca de 65%, estejam na
informalidade, e milhares destes submetidos a situações de trabalho
degradantes, com jornadas exaustivas e até mesmo trabalho escravo.
Há uma fiscalização forte por parte do governo para
verificar se as leis estão sendo cumpridas?
Não.
Apesar dos avanços nos últimos anos nas ações de fiscalização, como a criação
dos grupos móveis de combate ao trabalho escravo, ainda percebe-se uma ausência
considerável do Estado nas frentes de trabalho.
Isso
ocorre pela falta de auditores fiscais e estruturas físicas para atender às
demandas nas Superintendencias Regionais do Trabalho, além da grande quantidade
de frentes de trabalho existentes nos Estados.
Que processos levaram os trabalhadores rurais a
conquistar esses direitos?
Foi
a atuação do Movimento Sindical ao longo da história, para conquistas destes
direitos como pela manutenção dos existentes.
A
conquista da NR 31, por exemplo, levou anos de negociação e mobilização dos
trabalhadores, assim como as greves no setor sucroalcooleiro, fruticultura,
etc., que fizeram com que pudéssemos ter essa legislação, ainda que
insuficiente.
A
luta dos trabalhadores pela manutenção dessas conquistas é permanente, tendo em
vista que ao longo dos anos a bancada ruralista a vem tentando suprimir os
direitos destes trabalhadores.
Quais os interesses da bancada ruralista em alterar
as leis trabalhistas?
Pretendem
flexibilizar a legislação para construir relações de trabalho cada vez mais
frágeis no campo, tudo isso para economizar com a mão-de-obra que já é
barata. Nas propostas existentes de constituir uma jornada flexivel, por
exemplo, o grande objetivo é não realizar o pagamento de horas extras, mesmo
submetendo estes trabalhadores a jornadas exaustivas.
No
que se refere à saúde e segurança, o objetivo é flexibilizar a NR-31,
diminuindo instrumentos de proteção relacionados a transporte, alojamentos e ao
próprio processo de fiscalização pelos auditores fiscais.
Como
sempre, eles querem diminuir custos e aumentar seus lucros, retirando direitos
dos trabalhadores. Nada de novo para um setor que continua admitindo a prática
de trabalho escravo em seus empreendimentos, apesar dos inúmeros casos
flagrados pelas fiscalizações.
Como
você avalia o argumento usado pelos ruralistas de que “deve existir uma lei
específica para o trabalhador rural, pois seu trabalho é diferente do homem do
campo”?
Na
verdade é uma tentativa antiga, existente na própria CLT, que prevê a
possibilidade de tratamento diferenciado para campo e cidade.
Como
os setores patronais urbanos não conseguem flexibilizar toda a legislação
trabalhista, este argumento é uma forma de tentar justificar a flexibilização
somente na área rural. É uma forma de desmobilizar a sociedade que pouco
conhece da realidade do campo. Não há justificativa pra dar tratamentos
diferenciados para os trabalhadores do campo.
Quais seriam as consequências para os trabalhadores
se a NR 31 fosse derrubada ou alterada?
Se
isso ocorrer, prejudicaria as condições de trabalho no que se refere à saúde e
segurança, expondo trabalhadores a riscos seríssimos de vida. Outro prejuízo
refere-se ao processo de fiscalização, já que a NR-31 é responsável por
garantir condições e segurança jurídica das autuações dos auditores fiscais do
Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Na
verdade, derrubar a NR 31 ou modificá-la, além de suprimir a proteção do
trabalhador, representa prejudicar consideravelmente o processo de
fiscalização, ou seja, mais obstáculos para a ação fiscalizatória do Estado.
A alegação dos ruralistas é que essa lei é muito
rígida...
A
NR-31 foi construída de forma tripartite: Estado, Categoria Profissional e
Categoria Patronal, ou seja, eles consideram rígidas uma norma que foi
construída por eles mesmos? Foi um longo processo de negociação que
possibilitou a criação da NR 31 com a participação de todos os atores
envolvidos.
Não
há justificativa para que ela seja considerada rígida e muito menos para que
ela não seja aplicada. O que há, sim, é o descumprimento por parte do setor
patronal daquilo que foi acordado entre as partes na mesa de negociação. Talvez
eles imaginassem que os sindicatos não iriam cobrar a sua aplicação e que essa
legislação fosse apenas mais uma que ficaria engavetada.
No
entanto, mesmo com a precariedade da fiscalização, ela tem sido cobrada e
tem-se buscado incluir seus principais pontos nos acordos coletivos, o que dá
um maior poder de fiscalização também para os sindicatos, por isso que agora
eles tentam uma forma de derrubá-la.
Os ruralistas também querem alterar o conceito de
trabalho escravo. Como você analisa o conceito atual, e quais as conseqüências
de uma possível alteração?
Eles
tentarão conceituar de forma diferente “trabalho escravo”, “jornada exaustiva”
e “trabalho degradante”. Ou seja, tentam tornar situações inaceitáveis em
aceitáveis, descaracterizando-as do trabalho escravo.
A
forma como o conceito que está sendo proposto, certamente, permitirá que
trabalhadores sejam submetidos à situações degradantes, sem que haja a punição
rígida como existe atualmente quando esta situação é considerada trabalho
escravo.
Eles
tentarão limitar o conceito, fazendo que situações graves não sejam
consideradas
trabalho
escravo, escapando assim da punição. A conseqüência será a exposição maior dos
trabalhadores e uma falsa sensação de que o problema não existe, já que se o
conceito for simplificado o número de casos aparentemente cairá.
Ao
invés do setor patronal encarar o problema de frente, aceitando que existe maus
empregadores no seu meio, que praticam o trabalho escravo e que devem ser
punidos e
excluídos do setor produtivo, eles buscam criar uma legislação que
máscara o problema e com isso diminua a estatística tão vergonhosa para o
Brasil e para os empresários rurais.
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