Wagner Nabuco, diretor-geral da publicação, alegou
“quebra de confiança” nos trabalhadores que iniciaram a paralisação no dia 8
após ameaça de demissão em massa.
11/03/2013
Michelle Amaral, da Redação
A equipe de redação da Revista Caros Amigos, que
realizava uma greve desde a última sexta-feira (8), foi demitida. Em reunião
nesta segunda-feira (11) com os editores, jornalistas e designers gráficos, o
diretor-geral da publicação Wagner Nabuco argumentou “quebra de confiança” nos
profissionais em greve.
A jornalista Gabriela Moncau afirma que os integrantes da
redação foram convocados por Nabuco através de um e-mail, no domingo (10), para
a reunião desta segunda. “A gente tinha a perspectiva de que fosse uma reunião
para conversar sobre a situação da revista, mas não foi isso que aconteceu, ele
demitiu a todos”, conta.
A paralisação foi iniciada após o anúncio de um corte de
50% na folha de pagamento da redação, que passaria de R$ 32 mil para R$ 16 mil.
Segundo a jornalista, o anúncio foi uma surpresa para todos da equipe. “Foi um
comunicado, não foi um convite à conversa para falar sobre a situação
financeira da revista e ver como coletivamente a gente podia resolver essa
situação”, afirma.
Conforme Gabriela, a decisão pela greve foi tomada devido
à falta de diálogo da administração com os trabalhadores após o anúncio do
corte na folha de pagamento. “A gente achou que a greve era a única forma de
pressionarmos para uma conversa para evitar que boa parte da revista fosse
demitida sumariamente”, explica.
De acordo com nota divulgada pelos jornalistas, o
diretor-geral justificou o corte na folha de pagamento “devido ao pagamento de
dívidas fiscais acumuladas desde o ano 2000 e ao déficit operacional entre receitas
da editora e custos fixos, incluindo os nossos (baixos) salários”.
Gabriela disse que a equipe de redação nunca teve acesso
às contas da revista, que é mantida principalmente por anúncios, além da venda
em bancas e assinaturas. Apesar disso, a jornalista afirma que, no último
período, os profissionais se prontificaram a tentar ajudar a melhorar as
condições financeiras da revista com a realização de mais edições especiais
para serem vendidas nas bancas. “Existem uma série de alternativas para a gente
tentar melhorar a situação financeira da revista”, completa.
Ela relata que desde a divulgação da nota sobre a greve
na sexta-feira (8), a equipe recebeu diversas manifestações de solidariedade.
Nesse sentido, acredita que alternativas como a publicização da crise
financeira e a criação de uma campanha para ajudar a revista poderiam ser
tomadas para que não fossem necessárias as demissões dos profissionais. “A
gente compreende que existem dificuldades financeiras na Revista Caros Amigos,
como existem dificuldades financeiras em uma série de outras publicações. Mas
isso não justifica que as condições de trabalho sejam cada vez mais
precarizadas”, argumenta.
Precarização
Na nota divulgada na sexta-feira (8), os integrantes da
equipe denunciaram “a crescente precarização das nossas condições de trabalho,
seja pela ausência de registro na carteira profissional, o não recolhimento das
contribuições do FGTS e do INSS, e, agora, o agravamento da situação pela
ameaça concreta de corte da folha salarial em 50%, com a demissão de boa parte
da equipe”.
No entanto, conforme ela, a redação mantinha um diálogo
permanente com a administração da Caros Amigos a fim de melhorar as condições
de trabalho, com alguns pequenos avanços no que diz respeito ao salário -
ainda assim pago abaixo do piso da categoria de R$ 3.504,29 para 7 horas
diárias. “Desde 2009, que foi quando essa equipe que há na redação hoje começou
a ser montada, a gente tem se organizado para conversar com o diretor-geral da
revista para ir gradativamente melhorando as nossas condições de trabalho”,
conta.
Segundo a jornalista, a equipe de redação sempre teve
dificuldades com relação a essas questões trabalhistas. “A gente nunca chegou a
ganhar acima do piso ou teve perspectivas de registro [em carteira]”, afirma.
Veja nota sobre a demissão em massa divulgada pelos
trabalhadores:
DIRETOR
DA CAROS AMIGOS DEMITE EQUIPE DA REDAÇÃO EM GREVE
O diretor-geral da revista Caros Amigos, Wagner Nabuco,
chamou hoje (11/03/2013) a equipe de redação e anunciou que a empresa está
demitindo todos os trabalhadores que se encontravam em greve desde sexta-feira,
dia 08/03, alegando "quebra de confiança".
Nós, integrantes da equipe de redação da revista Caros
Amigos - responsáveis diretos pela publicação da edição mensal, o site Caros
Amigos, as edições especiais e encartes da Editora Casa Amarela - lamentamos a
decisão da Direção. Consideramos a precarização do trabalho e a atitude
unilateral como passos para trás no fortalecimento do projeto editorial da
revista, que sempre se colocou como uma publicação independente, de jornalismo
crítico e de qualidade, apoiando por diversas vezes, inclusive, a luta de
trabalhadores de outras áreas contra a precarização no mercado de trabalho.
A greve é um instrumento legal, previsto na Constituição
brasileira e direito de todos os trabalhadores. Foi adotada como medida para
tentar melhorar as condições de trabalho na revista e foi precedida por uma
série de incansáveis diálogos por parte desta equipe, desde que ela começou a
ser montada em 2009. As tentativas foram sempre no sentido de atingir o piso
salarial para todos os profissionais, encerrar os atrasos no pagamento dos
salários e direitos como férias e 13º, que nos atingiram por mais de uma vez,
de conquistar o registro dos funcionários fixos e uma melhor relação com
colaboradores freelancers, que também convivem e conviveram com baixas
remunerações e atrasos nos pagamentos.
Diante de alegações por parte da direção sobre
dificuldades financeiras vividas pela empresa por se tratar de uma publicação
alternativa, convivemos com salários mais baixos que os pisos e os praticados
pelo mercado, e também com a inexistência de muitos direitos trabalhistas.
Aceitamos negociar gradativamente a correção desses problemas de forma a fazer
com que a Caros Amigos, "a primeira à esquerda", não se tornasse
agente de exploração de seus funcionários e avançasse nessa frente conforme
suas possibilidades. Trabalhamos para ampliar a receita da empresa, seja pelo
prestígio do trabalho realizado, muitas vezes premiado, seja pelo aumento do
trabalho em forma de outras publicações como especiais e encartes.
Em todos os anos entre 2009 e 2013, mantivemos o diálogo
salutar com a Direção, buscando negociar melhores condições para desenvolvermos
o trabalho com o qual estávamos comprometidos. Isso foi feito por meio de
cartas de toda a redação à direção, conversas de comissões da redação com a
direção e inúmeras negociações entre o editor-chefe e diretor-geral.
Apesar de todos nossos esforços em construir uma boa
relação interna, fomos pegos de surpresa com o anúncio de corte da folha
salarial em 50%, com a demissão de boa parte da equipe ou redução do salário
dos 11 funcionários de 32 mil pra 16 mil ao todo, conforme relatado em nota
divulgada na data de anúncio da greve e que segue novamente ao final desta.
O anúncio de medida drástica que atinge diretamente os
trabalhadores foi feito em forma de comunicado pelo diretor-geral, sem margem
para negociação. Ainda buscamos pelo diálogo reverter o problema junto à
direção por uma semana. Sem margem para conversa, recorremos à paralisação como
forma de ampliarmos nossas vozes, mas fomos surpreendidos mais uma vez com o
comunicado da demissão coletiva.
Nossa luta não é - e nunca foi - contra a
revista Caros Amigos. Pelo contrario, reforçamos a importância de publicações
contra-hegemônicas e críticas em um cenário difícil para a democratização da
comunicação no Brasil, que cerceia a variedade de vozes. Nossa luta é,
portanto, para o fortalecimento e a coerência de um veículo fundamental do qual
sempre tivemos o maior orgulho de participar.
Vimos a público lamentar profundamente que essa crise
provocada pela direção ‘venha causar sérios prejuízos ao projeto editorial da
Caros Amigos, que contou por todos esses anos com nossa dedicação.
Saímos desse espaço de forma digna diante de uma situação
que tornou a greve inevitável, na esperança que nossos apelos sirvam de acúmulo
para o futuro da Caros Amigos de modo que ela se torne exemplo não só no campo
editorial, mas nas relações que mantém com seus funcionários e colaboradores.
Esperamos que o compromisso assumido com colaboradores durante a gestão dessa
equipe seja louvado e que eles recebam seus pagamentos sem atrasos. Também que
sejam honrados nossos diretos trabalhistas.
Agradecemos todos que se solidarizaram com nossa situação
e os que seguirão nos apoiando nessa nova etapa. Esperamos que esta experiência
sirva de acúmulo e motivo de debate sobre a precarização, o achatamento de
salários, a piora nas condições de trabalho e atitudes patronais - que existem
tanto em empresas da grande imprensa quanto nas da contra-hegemônica - no
sentido de buscarmos melhores condições para todos exercerem suas profissões.
Por fim, esperamos que o exemplo comece pela imprensa contra-hegemônica com a
correção de práticas como esta.
São Paulo, 11 de março de 2013.
01 - Alexandre Bazzan
02 - Caio Zinet
03 - Cecília Luedemann
04 - Débora Prado
05 - Eliane Parmezani
06 - Gabriela Moncau
07 - Gilberto Breyne
08 - Hamilton Octavio de Souza
09 - Otávio Nagoya
10 – Paula Salati
11 - Ricardo Palamartchuk
Nenhum comentário:
Postar um comentário