Por Verena Glass
Estabelecimentos flagrados com escravos
em 2012
|
1. Pará (PA) ....................34
2. Tocantins (TO) .............16 3. Goiás (GO)....................9 4. Amazonas (AM)..............8 Mato Grosso (MT) ..........8 Maranhão (MA)..............8 Piauí.............................8 8. Paraná (PR)...................7 São Paulo (SP)..............7 10. Minas Gerais MG)........6 11.Bahia............................5 Mato Grosso do Sul (MS).5 Santa Catarina (SC) ......5 14. Espírito Santo (ES) .......2 Rio de Janeiro (RJ).........2 Rio Grande do Sul..........2 Rondônia......................2 |
Apesar da dificuldade de identificar com precisão as atividades de todos os estabelecimentos flagrados, a partir dos registros na Classificação Nacional de Atividades Econômicas (Cnae, instrumento de padronização de códigos de atividades econômicas utilizado pelos diversos órgãos de administração tributária do país) é possível estimar que o padrão detectado nos anos anteriores se manteve em 2012: a pecuária apresentou, de longe, o maior número de resgates de trabalhadores escravos, seguida por atividades ligadas ao plantio e extração de madeira e pelo carvão. Ou seja, 56 libertações ocorreram em fazendas de criação - ou com registro de criação - de gado, 21 em empreendimentos de plantio (ou com registro) de eucalipto, pinus e exploração de madeira, e 16 em carvoarias.
Outro setor que teve número significativo de casos de trabalho escravo foi a sojicultura. Ao mesmo tempo em que a área de soja plantada em terras recém-desmatadas na Amazônia saltou de 11,69 mil ha para 18,41 mil ha na safra 2011/2012 (um aumento de 57%) de acordo com dados da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais, em 2012 o Grupo Móvel resgatou 144 trabalhadores em 10 fazendas de soja ou com registro de produção do grão.
O Pará é o estado em que mais operações foram realizadas e onde
aconteceram mais flagrantes, conforme tabela ao lado.
Casos emblemáticos
A libertação recorde de 2012 ocorreu no setor do carvão, e envolveu três das
maiores siderúrgicas do Pará. Em março, o Grupo Móvel resgatou 150 pessoas de
duas carvoarias em Novo Repartimento, que abasteciam as siderúrgicas Sidepar,
Cosipar e Ibérica. De acordo com a fiscalização, os trabalhadores desmatavam a
região ilegalmente para fabricar o carvão, e a operação acabou descobrindo um
esquema de crimes ambientais, emissão de notas fiscais falsas e até ameaças a
trabalhadores. Foram lavrados 21 autos de infração e um processo contra as três
siderúrgicas, mas, como as empresas formaram um consórcio, a fiscalização
responsabilizou a Sidepar pelo crime de escravidão.
Outra siderúrgica autuada por prática de trabalho escravo foi a Viena, de Darcinópolis, também no
Pará. No final de outubro, uma fiscalização libertou 89 pessoas que trabalhavam
no corte de eucalipto e produção de carvão na fazenda Vale do Canoa III, de
propriedade as siderúrgica. De acordo com os fiscais, os trabalhadores viviam
em condições péssimas de higiene, não tinham energia, água potável, banheiros,
área de vivência, transporte adequado, nem equipamentos de proteção individual.
Uma das maiores produtoras e exportadoras de ferro-gusa do Brasil,
a Siderurgica Viena - que também é dona da Fazendas Reunidas Agroindustrial, em
Pirapora (MG), e da marca de cachaça Pirapora - exporta,
segundo informações de seu site, para os mercados europeu, asiático e
estadunidense. Tanto a Viena quanto a Sidepar são signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo e podem ser suspensas devido aos
flagrantes.
A segunda maior libertação ocorreu na única usina de cana flagrada
com trabalho escravo no ano passado. Em setembro, a fiscalização do MTE e do
Ministério Público do Trabalho resgatou 125 trabalhadores da usina Sabaralcool
S/A Açúcar e Álcool, em Perobal, no Paraná, de uma situação descrita como
"grave demais". Contratados pelos chamados "gatos"
(intermediadores de mão de obra), trabalhadores da Bahia, Pernambuco e Maranhão
foram submetidos a péssimas condições de alojamento, transporte e alimentação,
eram obrigados a comprar seus próprios instrumentos de trabalho, a contrair
dívidas com os contratantes e o comércio local e a trabalhar aos domingos, não
tinham descanso mínimo de uma hora durante as jornadas de trabalho, e não
tinham o menor controle sobre o pagamento.
A Sabaralcool, que detém o selo de "empresa Amiga da
Criança", pertence à família do empresário Ricardo Albuquerque Rezende,
falecido em
março último. Rezende havia
sido presidente da Associação Paranaense dos Produtores de Bioenergia do Paraná
(Alcopar) por três mandatos e, antes de sua morte, ocupava o posto de
vice-presidente da entidade. Também foi diretor do Centro de Tecnologia
Canavieira (CTC). De acordo com a fiscalização, a usina já havia sido
notificada por problemas trabalhistas em 2007, ano em que foi firmado um Termo
de Ajustamento de Conduta. A situação encontrada em 2012, além de muito grave,
se caracterizou como "fraude deliberado do TAC", afirmaram os fiscais.
Mulher grávida trabalhava da Sabaralcool, usina que tem o selo empresa Amiga da Criança. Foto: Divulgação/MTE
Setor
têxtil
No setor de vestuário, em 2012 foram libertados 32 trabalhadores que costuravam para as grifes Gregory e Talita Kume e para a confecção WS Modas Ltda (fornecedora da Gregory e dona da marca Belart). Dada a notoriedade das marcas, estes resgates tiveram grande repercussão na opinião pública. Na semana em que foi divulgada a ligação da Gregory com exploração de trabalhadores, dezenas de pessoas se manifestaram protestando na pagina do Facebook da empresa - que, assim como Marisa, Pernambucanas e Zara, autuadas por trabalho escravo em anos anteriores, foi convocada para depor em oitiva na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Trabalho Escravo. Já a Talita Kume se apressou em incluir em seu site uma página onde promete cumprir normas trabalhistas.
Jovem costurava para Gregory com filho recém-nascido no colo. Foto: Bianca Pyl
Já
no setor de construção civil, 136 operários foram resgatados em fiscalizações
nas empresas Racional Engenharia Ltda
(trabalho
na ampliação do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, na região da Avenida Paulista) em
São Paulo, Construtora Croma Ltda (obras de um conjunto habitacional da
Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo -
CDHU) em Bofete (SP), Construtora
Central do Brasil (obras da duplicação da rodovia federal BR-060,
projeto do PAC) em Indiara (GO), e Brookfield Centro-Oeste Empreendimentos
Imobiliários, em Goiânia. Além disso,12 trabalhadores foram libertados na
fazenda de João Pedro Pereira, em Barra do Piauí (PI), onde
construíam instalações na propriedade.
Outros
dois casos de 2012 receberam destaque por envolver as famílias da senadora
Kátia Abreu (PSD-TO) - cujo irmão, André Luiz de Castro Abreu, foi
apontado pela Superintendência Regional de Trabalho e Emprego do Tocantins como
co-proprietário da Fazenda Água Amarela (plantio de eucalipto e produção de
carvão), onde foram resgatados 56 trabalhadores -, e do banqueiro
Daniel Dantas - cuja irmã, Verônica Dantas, e ex-cunhado, Carlos
Bernardo Torres Rodenburg, são proprietários da Agropecuária Santa Bárbara, em
São Felix do Xingu (PA), onde foram libertados quatro trabalhadores.
Por
fim, vale relembrar ação realizada em agosto na fazenda de gado Alô Brasil, em
Marabá (PA), que foi acompanhada por quatro
deputados da CPI do Trabalho Escravo e resultou na libertação de oito
trabalhadores. Na ocasião, o deputado federal Giovanni Queiroz (PDT/PA),
integrante da bancada ruralista (que costuma contestar a existência de trabalho
escravo no país) considerou a situação "vergonhosa, constrangedora"
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário