2 de janeiro de
2013
«Os
trabalhadores da Walmart sabem o que é trabalho injusto porque o sofrem todos
os dias». Por David Bacon
Nas
últimas Black Fridays, a comemoração do consumo que ocorre anualmente nos
Estados Unidos depois do Dia de Acção de Graças, houve uma tal afluência
de clientes às lojas Walmart que algumas pessoas foram espezinhadas ao tentarem
entrar. No entanto, na Black Friday de 2012 os compradores presenciaram
protestos de trabalhadores em mais de mil lojas.
A
Walmart é a terceira maior companhia mundial e a maior empresa mundial de
comércio a retalho [varejo], com mais de dois milhões de trabalhadores em mais
de 15 países. Tem uma tradição de salários baixos e uma política explicíta
contrária a qualquer tentativa de organização dos trabalhadores em sindicatos
ou instituições independentes.
Um
estudo efectuado pela Universidade da Califórnia em Berkeley mostra que os
salários são tão baixos que os trabalhadores da Walmart na Califórnia recebem
anualmente 86 milhões de dólares de assistência pública relativamente a seguros
de saúde e senhas para alimentos, financiados por quem paga os impostos. Desde
há vários anos, têm sido muitas as críticas aos baixos salários praticados pela
rede Walmart e à concorrência desleal para com os comerciantes locais. E
durante muito tempo a companhia conseguiu manter os seus empregados longe de
manifestações. Sempre que pode, a Walmart tenta apresentar um rosto
paternalista de que somos todos uma grande família. Quando isto não
funciona, recorre à velha táctica dos despedimentos [demissões] e do medo.
Mas
os trabalhadores da Walmart estão a despertar e organizaram uma associação
chamada OURWalmart (Organização Unida pelo Respeito na Walmart). Apoiados por
um grande número de sindicatos, promoveram uma série de greves. A última e a
maior ocorreu na Black Friday. O centro dos protestos nacionais da Black Friday
foi Richmond, na Califórnia, já que dois presidentes de sindicatos
internacionais [sindicatos activos nos Estados Unidos e no Canadá] e um dos
membros do Congresso mais favoráveis aos direitos dos trabalhadores uniram-se a
trabalhadores despedidos [demitidos] e a outros ainda com emprego, bem como a
várias centenas de apoiantes do movimento.
Em
dado momento, a presidente do Sindicato Internacional dos Trabalhadores de
Serviços (SEIU), Mary Jay Henry, e a reverenda Carol Been, organizadora dos
Clérigos e Leigos Unidos pela Justiça Económica, colocaram-se à frente de uma
delegação que entrou na loja e tentaram entregar ao gerente uma lista de
reivindicações, exigindo a recontratação dos despedidos e o respeito pelo
direito à liberdade de expressão e de organização. Mas o gerente recusou-se a
receber essa lista. Entretanto, os trabalhadores despedidos, apoiados por
alguns que mantinham o emprego mas haviam deixado o trabalho para participar no
protesto, entraram em confronto com os seguranças da Walmart. «Fui despedido
porque protestei contra os comentários racistas do gerente de uma loja»,
declarou Misty Tanner.
Segundo
o SEIU, quando um empregado afro-americano usou uma corda para puxar uma
mercadoria, o gerente VanRiper disse-lhe: «Se fosse eu, punha-te esta corda ao
pescoço». Em seguida, quando uma trabalhadora estava a falar com jornalistas,
VanRiper ameaçou atropelá-la. Ela disse que de repente a preveniram de que já
não tinha trabalho, apesar de as obras continuarem depois de ela ter ido
embora. Os gerentes recusaram-se a fazer comentários sobre o seu caso, ou aliás
a fazer quaisquer comentários.
A
manifestação de Richmond foi organizada pela OURWalmart e por todo o lado se
viam as Tshirts [camisetas] verdes do grupo. Ainda que conte com o apoio do
Sindicato dos Trabalhadores da Alimentação e Comércio (UFCW), trata-se de uma
organização autónoma, segundo dizem os próprios trabalhadores da Walmart.
Alguns dias antes da Black Friday a Walmart apresentou uma queixa perante a
Agência Nacional das Relações de Trabalho (NLRB), alegando que o UFCW e a
OURWalmart estariam unidos organizacionalmente e que o sindicato violara a lei
ao conduzir greves de reconhecimento por mais de 30 dias sem se inscrever na
NLRB para a eleição dos seus representantes. «Isto só mostra a falta de
respeito da Walmart para connosco», declarou Tanner. «Não estamos a organizar
um sindicato, estamos a exigir que a companhia nos respeite e ponha fim à
violação dos nossos direitos. A OURWalmart é uma organização de associados da
Walmart».
A
acção da Walmart junto à NLRB, acusando as greves de ilegalidade, parece uma
tentativa de impedir a participação dos trabalhadores nas manifestações
projectadas para chamar a atenção dos consumidores no maior e mais importante
dia de compras do ano. Os grandes estabelecimentos de comércio a retalho
[varejo], como a Walmart, contam com o dia seguinte à Acção de Graças para dar
início à loucura consumista do Natal e garantir os lucros do ano. Em resposta,
os organizadores da OURWalmart disseram que ocorreram manifestações em mais de
mil lojas, espalhadas por 46 estados. Bill Simon, o presidente e CEO [chief
executive officer, isto é, o principal gestor] da Walmart nos Estados
Unidos, disse ao jornal britânico The Guardian que «na noite
passada [a noite anterior à Black Friday] houve apenas 26 manifestações em
lojas, e em várias delas não participou nenhum empregado da Walmart. Nas nossas
lojas por todos o país tivemos uma Black Friday com muita tranquilidade e
sucesso e as opiniões dos consumidores têm sido incrivelmente positivas».
Talvez ele não tivesse recebido notícias dos gerentes de Richmond, pois essa
loja esteve fechada durante várias horas e muitos consumidores voltaram para
casa quando os empregados lhes explicaram por que motivo ali estavam.
O
deputado George Miller, proponente da lei de reforma das questões de
trabalho Employee Free Choice nas últimas sessões do
Congresso, disse aos trabalhadores no parque de estacionamento da loja que a
comunidade de Richmond, que ele representa, os defenderia a todos. «Não vamos
permitir que nenhum patrão maltrate os trabalhadores pelo facto de pretenderem
organizar-se», disse ele, «especialmente quando reivindicam um nível de vida
decente, tal como todos os trabalhadores merecem». Mary Jay Henry respondeu à
acção da Walmart, que invocara práticas trabalhistas ilegais, perguntando:
«Sabem o que é uma prática trabalhista ilegal?». E ela mesma deu a resposta:
«Trabalho injusto é trabalhar a tempo integral e viver na pobreza. Trabalho
injusto é ver o custo do seguro de saúde aumentar todos os anos. Trabalho
injusto é negarem as horas necessárias para dar apoio à família. Trabalho
injusto é ser castigado por exercer a liberdade de expressão e de associação.
Os trabalhadores da Walmart sabem o que é trabalho injusto porque o sofrem
todos os dias».
Traduzido
por Passa Palavra a partir de http://passapalavra.info/?p=70094
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