26/09/2013
Trabalhadores aliciados pela OAS no
Nordeste viviam em condições precárias. Obra foi terceirizada pela
concessionária que administra o aeroporto
Escrito por: Viviane Claudino – Rede Brasil Atual
Uma operação de fiscalização encontrou
111 pessoas vivendo em condições análogas à escravidão, em regiões próximas a
Guarulhos, na Grande São Paulo. Segundo o Ministério Público do Trabalho e do
Ministério do Trabalho e Emprego, funcionários da empresa OAS, uma das
maiores construtoras do Brasil, aliciaram trabalhadores da região Nordeste para
trabalhar na ampliação do Terminal 3 do aeroporto de Cumbica, um dos maiores da
América Latina. Eles foram encontrados em alojamentos com condições
precárias de higiene, sem alimentação nem roupas de frio. Alguns estavam
doentes. Sobreviviam desde julho, quando chegaram à capital, com ajuda de
moradores da região e representantes da igreja.
Resgatados a partir do dia 6, após
denúncia Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do
Mobiliário de Guarulhos e Arujá, esses operários iriam trabalhar como
carpinteiros, pedreiros e armadores, com a promessa de registro em carteira,
salário de R$ 1.400, vale-refeição e transporte. Trazidos de Pernambuco, Bahia,
Piauí e Maranhão (seis são de origem indígena), eles teriam pago a funcionários
da construtora uma taxa de R$ 300 para o transporte até São Paulo, mais R$ 100
como garantia da vaga.
Os trabalhadores fizeram os exames
médicos solicitados, mas não estavam trabalhando nas obras do aeroporto, pois
faziam parte de um “estoque” de trabalhadores, um "banco de espera" à
disposição da empresa. “A CLT prevê que a contratação pode ocorrer no local de origem,
desde que a empresa contratante apresente uma certidão declaratória de
transportes de trabalhadores, onde deve informar o local e as condições de
trabalho e se responsabilizar com todo o processo de contratação, incluindo a
viagem até a cidade de destino, o que nunca foi obedecido”, afirmou a
procuradora do MPT Christiane Vieira Nogueira. Representantes do MTE e do
MPT afirmam que as investigações continuam para apurar se mais 160 pessoas
estão submetidas às mesmas condições, totalizando 271.
“Estamos tomando providências porque
existem mais trabalhadores nessa situação. O povo que tem dinheiro acha que
pode pisar no povo nordestino, eu pensava que nunca mais veria esse tipo de
trabalho que ainda ocorre no Brasil”, disse o presidente do sindicato, Edmilson
Girão da Silva, o Índio.
“Esse é o primeiro passo, continuamos
investigando para compreender a real dimensão disso. As investigações ocorrem
também com a participação do Ministério Público Federal para verificação de
ação criminal no caso”, afirmou o coordenador de Ações de Trabalho Escravo da
Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE) de São Paulo, Renato
Bignami.
O MTE, por meio do Programa Estadual de
Ratificação do Trabalho Escravo, responsabilizou a OAS pela condição degradante
de manter trabalhadores em condições análogas a escravidão. Em nota, a
construtora declarou que "vem apurando e tomando todas as providências
necessárias para atender às solicitações" do ministério.
A GRU Airport, empresa que
terceirizou os serviços contratando a OAS para realização do serviço, foi
incluída na ação cautelar e poderá ser responsabilizada no final da ação por
todas as ações trabalhistas.
“Existe um entendimento do Tribunal
Superior do Trabalho (TST) com a Súmula 331, que responsabiliza em caso de
terceirização a empresa tomadora de serviços e a prestadora. Portanto, existe o
enquadramento da contratante no processo que tramitará para aferir o
grau da responsabilidade da concessionária”, observou a juíza
Patrícia Therezinha de Toledo, do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região.
Os trabalhadores resgatados já voltaram
a seus locais de origem. Eles foram indenizados com o valor médio de R$ 6 mil
cada e receberão todas as verbas rescisórias, além do pagamento de três
parcelas de seguro-desemprego. Eles também terão prioridade na inclusão de
programas sociais como Bolsa Família e Pronatec.
Contra a empresa foram lavrados 25
autos de infração, totalizando cerca de R$ 140 mil em multas. A construtora
poderá ser incluída no cadastro de empregadores que mantêm trabalhadores em
condições análogas à escravidão, a “lista suja” do MTE. Assim será monitorada
pela fiscalização por mais dois anos e terá restrições de recebimento de
financiamento público até comprovar a regularidade. O MPT pediu o bloqueio de
bens da OAS e da GRU Airport, no valor de R$ 15 milhões para cada. A OAS pode
ser responsabilizada em ação civil, administrativa, trabalhista e criminal.
Funcionários da construtora que atuavam na rede clandestina de aliciamento
também podem ser indiciados criminalmente pelo caso.
“Isso pode ser a ponta de um iceberg.
Infelizmente, acredito que muita gente nessas situações ainda irá aparecer. É
necessário visitar todas as obras feitas em sistema de emergência, como esta
que está ocorrendo em Guarulhos”, diz o superintendente regional, Luiz
Antônio de Medeiros, referindo-se às obras que deverão ser entregues para a
Copa do Mundo de 2014.
Em nota, a OAS nega que as vítimas
sejam seus empregados e afirma que "a empresa, nas pessoas dos seus
representantes, não teve qualquer participação no incidente relatado".
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